É possível construir um modelo de compreensão do actual regime jurídico dos CTR a partir de uma estrutura com quatro níveis normativos, de acordo com um critério de densidade regulatória: (i) o nível das normas do DL 134/2009, que configuram o RJCTR em sentido estrito, (ii) o nível das normas do DL 24/2014, que configuram o regime dos contratos celebrados à distância, (iii) o nível das normas referentes à contratação telefónica, à utilização de linhas telefónicas e às práticas comerciais desleais ou agressivas e (iv) finalmente, o nível das normas de enquadramento geral das actividades de relacionamento, em que já não existe nenhuma especificidade normativa para a actividade dos CTR[efn_note]Por ex., a aplicação do regime geral da protecção de dados pessoais nos CTR, quer no âmbito da gravação de chamadas, quer no âmbito do registo do histórico do atendimento. Cfr., sobre o tema, (Melo, 2016e) e (Melo, 2016c).[/efn_note].
O RJCTR definido pelo DL 134/2009 pode também ser compreendido através de uma classificação estrutural de princípios e regras em seis grupos de normas: (i) princípios ou deveres gerais de conduta, (ii) funcionamento geral, (iii) atendimento e recepção de chamadas, (iv) menus electrónicos, (v) emissão de chamadas e (vi) prestação de informação.
Inspirado no regime jurídico brasileiro da actividade dos “call centers”, a entrada em vigor do DL 134/2009 na ordem jurídica nacional representou um marco importante para a regulação da actividade dos CTR, estabelecendo o quadro normativo fundamental no âmbito do relacionamento com os consumidores, impondo padrões de conduta e restringindo muitas das práticas abusivas neste sector de actividade.
Contudo, na perspectiva da protecção dos direitos e interesses dos consumidores, o actual regime jurídico apresenta algumas lacunas ou insuficiências, constatando-se a necessidade de desenvolver e adequar o regime jurídico à realidade das práticas dos CTR.
Da compreensão dos diferentes níveis normativos e da classificação estrutural dos princípios e regras do RJCTR emerge a percepção da importância fundamental da transparência nos CTR e, sobretudo, a necessidade de, “de lege ferenda”, autonomizar um regime jurídico específico em matéria de gravação de chamadas e de registo do histórico do atendimento – duas matérias críticas, quer para efeitos probatórios, quer, sobretudo, para protecção dos interesses e direitos dos consumidores e dos profissionais.
Para além do desenvolvimento e adequação do actual RJCTR, seria interessante realizar uma investigação na perspectiva do “enforcement” das obrigações dos profissionais ou da tutela efectiva dos direitos e interesses dos consumidores ou utentes, focando a análise sobre a aplicação daquele regime pelas entidades administrativas responsáveis pela respectiva fiscalização e pelos tribunais, de forma a, no âmbito dos CTR, conhecer o direito em acção na ordem jurídica nacional[efn_note]Cfr., a título de ex. de análises de “law in action”, embora com investigação em outro âmbito, (Pinto, 2001), (Babo, 2012) e (Pinto, 2015).[/efn_note].