(VII) Princípios ou deveres gerais de conduta e ónus da prova

Apr 7, 2021 | Uncategorized

Nos arts. 4.º, 5.º, 6.º, 7.º e 8.º do DL 134/2009 são estabelecidos os princípios e as regras jurídicas específicas da actividade dos CTR, sendo possível identificar vários princípios ou deveres gerais e regras jurídicas especiais, passíveis de uma classificação sistemática estruturada em seis grandes áreas:

(i) princípios ou deveres gerais de conduta e ónus da prova;
(ii) regras gerais de funcionamento;
(iii) regras de atendimento e recepção de chamadas;
(iv) regras de menus electrónicos;
(v) regras de emissão de chamadas;
(vi) regras de informação.

O regime sancionatório aplicável está definido no art. 10.º-1, nos termos do qual “constitui contra-ordenação o incumprimento do disposto no artigo 4.º, no n.º 1 do artigo 5.º, nos n.os 1 a 7 do artigo 6.º, nos n.os 1 e 2 do artigo 7.º e nos n.os 3 a 6 do artigo 8.º”[efn_note]Cfr. a propósito do regime sancionatório no âmbito do RJCTR, de uma forma desenvolvida, (Melo, 2016g).[/efn_note].

Princípios ou deveres gerais de conduta e ónus da prova

 

Deveres gerais de abstenção do profissional

Nos termos do art. 5.º-2, “no exercício da actividade abrangida pelo presente decreto-lei, o profissional deve abster-se de abusar da confiança, falta de experiência ou de conhecimentos do consumidor ou do utente ou aproveitar-se de qualquer estado de necessidade ou fragilidade em que o mesmo se encontre”.

Este artigo reafirma um conjunto de deveres gerais de abstenção do profissional no âmbito do relacionamento com o consumidor ou utente, deveres esses comuns a qualquer tipo de relacionamento e não sendo específicos dos CTR.
O cumprimento destes deveres é tutelado pelos regimes gerais da responsabilidade civil e da responsabilidade penal, não estando associada qualquer tipo de responsabilidade contra-ordenacional específica ao respectivo incumprimento.

 

Princípio geral de urbanidade

Nos termos do art. 7.º-3, “caso o consumidor ou o utente expresse a vontade de não prosseguir a chamada, esta deve ser desligada com urbanidade”, consagrando-se, para além da obrigação de desligar a chamada, um princípio ou dever geral de urbanidade do profissional no relacionamento com o consumidor ou utente.

A lei não prevê qualquer tipo de sanção para as situações de incumprimento deste artigo.

 

Princípios gerais de informação

O art. 8.º estabelece um conjunto de princípios e de regras a que deve obedecer a prestação de informação aos consumidores e utentes.

Nos termos do art. 8.º-1, a “prestação de informação obedece aos princípios da legalidade, boa-fé, transparência, eficiência, eficácia, celeridade e cordialidade”[efn_note]Cfr. a norma do art. 8.º do Decreto 6523/08 (Decreto do Brasil): o “SAC obedecerá aos princípios da dignidade, boa-fé, transparência, eficiência, eficácia, celeridade e cordialidade”.[/efn_note]. Consagrando os princípios gerais a que deve obedecer a prestação de informação nos CTR, este artigo mistura princípios jurídicos gerais típicos, como os princípios da legalidade, boa-fé[efn_note]Sobre o princípio da boa-fé, cfr. (Dias, 2004) e, a propósito da relação entre boa fé e dignidade da pessoa humana, (Khouri, 2015).[/efn_note] e transparência, com princípios gerais de carácter operacional, como os princípios da eficiência, eficácia e celeridade.

A referência aos princípios gerais da eficiência, eficácia e celeridade, como princípios no âmbito da prestação de informação nos CTR, vem reforçar a legitimidade da sua utilização como critérios de interpretação e de aplicação do Direito do Consumo e, em especial, da sua utilização como critérios de densificação de outros princípios gerais do direito[efn_note]Como, por ex., para densificação do princípio geral da boa fé, no quadro geral do Direito Civil ou no quadro especial do Direito do Consumo.[/efn_note].

 

Inversão do ónus da prova

Nos termos do art. 6.º-8, “nos primeiros 90 dias contados da prestação do serviço, o ónus da prova do cumprimento das obrigações previstas no presente artigo cabe ao profissional”.

O ónus da prova[efn_note]Cfr., a propósito do ónus da prova, (Teixeira & Carvalho, 2013) e (Teixeira, 2015).[/efn_note] inverte o regime geral previsto no Código Civil, devendo destacar-se quatro questões fundamentais:

(i) a inversão do ónus da prova é realizada durante o prazo de noventa dias;

(ii) o prazo de noventa dias é contado a partir do início da prestação do serviço de atendimento, devendo considerar-se como tal o momento do atendimento efectivo da chamada pelo sistema de menu electrónico ou o início do período de espera em linha;

(iii) a inversão do ónus da prova aplica-se apenas às obrigações previstas no art. 6.º e

(iv) o prazo de noventa dias para a inversão do ónus da prova estava correlacionado com o prazo de manutenção da gravação das chamadas telefónicas, originalmente previsto no art. 9.º-2 e revogado pelo DL 72-A/2010[efn_note]Sobre esta problemática e as dificuldades criadas pela revogação do art. 9º, cfr. (Melo, 2016f).[/efn_note].